#Tenciona mudar o equilíbrio que hoje existe entre o poder central e o poder local?
Um governo demasiado hierarquizado não é solução. Mais depressa provocaria o caos do que a ordem. Temos, contudo, de separar as responsabilidades entre as autoridades locais de uma forma clara e inequívoca. Só assim poderemos evitar a duplicação de funções. Para isso teremos de alterar o direito de veto do Senado nas questões institucionais.
#Qual será a sua primeira medida económica?
Emprego para os jovens. A dificuldade dos jovens, das pessoas qualificadas, em arranjar emprego muito tem contribuído para a degradação da sociedade francesa. Pessoalmente, tenciono seguir um modelo semelhante ao adoptado por Tony Blair no seu primeiro mandato: pediu às empresas que se empenhassem mais nesta matéria e rapidamente obteve resultados.
#“Emprego para os jovens” – Lembra o mote da campanha do antigo primeiro-ministro Lionel Jospin em 1997.
No caso que refere não se tratava de empregos no sector privado, salvo os referentes a instituições de caridade. Estes empregos visam não só servir de “rampa de lançamento” para os jovens como estimular o emprego no sector privado. A minha maior motivação reside no que tem vindo a acontecer ao nível regional: é realista fixar uma meta de 500 mil empregos para os próximos cinco anos, desde que se abandone a economia da desconfiança. Mais: as universidades terão de se empenhar mais na colocação dos seus alunos, obtendo em troca uma maior autonomia orçamental.
#Depois das conversações que manteve com os parceiros sociais sentiu que estão preparados para abandonar aquilo a que chama “economia da desconfiança”?
Senti que os sindicatos estão mais determinados do que o Medef (organização patronal francesa), que estão prontos para entrar numa nova era de relações industriais. O Medef, pelo contrário, está nervoso e tem ficado aquém das expectativas das pequenas e médias empresas. O presidente do Centro para os Jovens Directores mostra-se particularmente entusiasmado, por exemplo. Enquanto a lógica for “todos saem a ganhar”, os sindicatos estarão dispostos a negociar compromissos. E isso é prometedor.
#A representação sindical deve ser reformada. Como?
Através de eleições. Os sindicatos discordam entre si sobre o melhor caminho a seguir, por isso, o debate deve prosseguir. Aconteça o que acontecer, quero ser eu a criar as fundações para uma sindicalização maciça. Nenhum empregado deve recear sindicalizar-se.
#Não rejeitou recentemente a ideia de sindicalização compulsiva?
Era uma boa ideia, embora demasiado revolucionária. Por ora, pelo menos.
#Quais serão os temas fortes das negociações entre os parceiros sociais e que será decidido ao nível político?
A prioridade vai para a negociação. Negociar soluções é uma opção mais inteligente e duradoura. O debate sobre receitas e crescimento será, pois, o primeiro passo. O Estado vai garantir a qualidade das conversações e definir a meta a alcançar, isto é, o aumento do poder de compra. Acredito plenamente no diálogo social. Caberá ao Parlamento zelar pela correcta implementação dos acordos alcançados, bem como financiá-los. Para mim é prioritário reconciliar o país com as empresas. Como poderemos fazê-lo numa altura em que as empresas que integram o CAC 40 [principal índice accionista francês] anunciam os maiores lucros de sempre e em que os salários dos seus directores são escandalosos, quando as empresas subcontratadas atravessam tremendas dificuldades?
#O que a choca mais? Os lucros - 100 mil milhões de euros - das grandes empresas?
O que mais me choca é ver que há muito dinheiro de um lado e muitos danos sociais do outro. A lógica da “financialização” é economicamente destrutiva. A distribuição dos os lucros deve ser mais transparente para que possam ser reinvestidos, ajudando assim à manutenção de postos de trabalho. Até os economistas mais liberais defendem esta tese.
#Quem deve decidir sobre a distribuição dos lucros? Os accionistas, como acontece actualmente, ou o Estado?
O Estado também deve estar envolvido.
#Defende o aumento dos impostos sobre o capital?
Não se devem aumentar os impostos por uma questão de convicção, mas porque beneficiam as empresas de trabalho intensivo.
#No geral, trabalha-se o suficiente em França?
O país deve trabalhar mais, obviamente, dando trabalho aos que não o têm como os jovens e os mais idosos. As empresas que defendem um horário mais alargado já estão a implementar esse modelo.
#Que pensa do aumento da carga horária para mais de 35 horas semanais, especialmente no caso das pequenas empresas?
Os parceiros sociais vão negociar.
#Refere frequentemente a ajuda modular ou condicionada às empresas. Pode ser mais concreta?
Gostaria que a ajuda concedida às empresas reflectisse as suas políticas de emprego e a aposta na inovação, assim como a sua exposição internacional à concorrência.
#Teceu duras críticas à banca…
Porque não assume os riscos inerentes ao financiamento de empresas. Prefere deixar esse papel para as autoridades locais. Isso não é correcto, na medida em que os bancos devem ajudar as pequenas e médias empresas a desenvolver-se.
#Como deve ser ajustado o imposto sobre as sociedades?
Defendo a sua redução no caso das empresas exportadoras. Para ganhar a batalha económica é preciso conquistar mercados estrangeiros.
#Pode ser mais precisa quanto ao valor da redução?
Não vou avançar pormenores nesta fase. É uma decisão que compete ao governo e ao Parlamento tomarem.
#Uma empresa que não exporte sofreria, simultaneamente, com a redução fiscal e com o aumento do salário mínimo para 1.500 euros mensais. Não acha que pode ser um duro golpe?
Algumas empresas precisam de ajuda, outras não. Quero ajudar as que realmente precisam e pôr fim aos financiamentos sem critérios. A lógica prevalecente deve ser a de “dar e tirar”.
#A Alemanha recuperou a sua competitividade reduzindo os custos laborais. Não seria esta a melhor estratégia para França, ao invés do aumento do salário mínimo e dos salários mais baixos?
O poder de compra de quem aufere o salário mínimo [em França] é um dos mais baixos da Europa. Podemos ser competitivos com salários mais justos.
#Segundo o Eurostat o salário mínimo francês, em paridade de poder de compra, é um dos mais elevados da Europa.
Essa comparação tem por base os índices de preços, que não reflectem o verdadeiro poder de compra das pessoas que auferem dos salários mais baixos. Não é com empregos precários, em part-time e mal pagos que vamos ter trabalhadores motivados e eficientes.
#A resposta reside no IVA social?
Sabemos quais são as desvantagens do IVA social e sabemos que não é justo. Falando em sentido lato, é preciso harmonizar as regras. Gostaria que o enquadramento fiscal e social dos próximos anos estivesse bem definido antes do final do ano. Os actores económicos precisam de visibilidade.
#Tenciona manter as deduções salariais?
Sim. Não faço parte daqueles que dizem que é possível reduzir as contribuições sociais e a dívida pública. É impossível. Temos de ser realistas para não descredibilizar a política.
#Está de acordo com François Bayrou nesta matéria?
François Bayrou não tem programa – só diz gabarolices!
#Tenciona rever o imposto sobre os rendimentos?
A nova tabela acentuou escandalosamente as desigualdades, pelo que deve ser reformulada em conformidade com a lei orçamental de 2008. Não é justo penalizar os escalões mais altos.
#Pode ser mais específica sobre esta matéria? É legítimo que o povo francês queira saber qual vai ser a sua política fiscal antes das eleições.
Essa matéria está interligada com outras questões. É fundamental que os franceses aceitem a tributação definida, mas para isso terão de compreender o que é feito com o seu dinheiro. Defendo, pois, um orçamento participativo para que os franceses percebam qual o uso dado às receitas fiscais. É o que faço na região pela qual fui eleita. Claro que é mais difícil de implementar a nível nacional, mas devemos ponderar essa possibilidade.
#Não adoptou a ideia avançada pelo ex-ministro das Finanças, o socialista Dominique Srauss-Khan, de taxar os franceses que residem no estrangeiro?
Não acho necessário taxar todos os franceses que residem no estrangeiro para compensar os que optaram por domiciliar-se em países com menor carga fiscal. Posso citar um paradoxo a este propósito: a Direita aprovou um tecto fiscal para o total de impostos que se podem aplicar sobre os rendimentos individuais, mas isso não impediu que alguns dos seus amigos saíssem do país.
#Tenciona alterar o imposto sobre a riqueza [‘Impôt de Solidarité sur la Fortune’]?
Não.
#Iniciou o seu discurso em Villepinte denunciando o peso da dívida pública antes de anunciar as 100 propostas do seu programa de governo, muitas delas onerosas. Onde está a poupança?
Há margem de manobra na reforma do Estado. Precisamos de um Estado que funcione bem e que seja capaz de reduzir custos, ainda que de forma simbólica. Defendo a redução do número de ministros e, acima de tudo, a descentralização. Quando me encontrei com os primeiros-ministros espanhol e italiano, Rodríguez Zapatero e Romano Prodi, disseram-me que a redução dos custos do Estado só foi possível através da descentralização.
#Em França, a descentralização foi sempre acompanhada pela duplicação de funções e por uma maior despesa.
É precisamente isso que queremos evitar no futuro.
#O governo central também será obrigado a reduzir o número de funcionários públicos?
Sim. O governo central recusou-se, até agora, a perder poderes, mas é fundamental reduzir o número de funcionários públicos paralelamente à transferência de competências.
#Tendo em conta o total de funcionários do governo central e local, justifica-se essa redução?
É preciso maior mobilidade. Nicolas Sarkozy [candidato do centro-direita] afirma que não vai substituir um funcionário em cada dois. Isso é inaceitável, nós vamos fazê-lo para evitar a ruptura e a destruição dos serviços públicos. Uma afirmação destas transmite uma forte dose de desconfiança face aos funcionários públicos. É o mesmo que dizer que um em cada dois não serve para nada. A Direita não será capaz de levar por diante a reforma do Estado porque não acarinha a função pública. Eu serei capaz porque acredito na função pública.
#O Estado deve reforçar a sua participação na energética Electricité de France (EDF) para os 100%?
O Estado deve controlar a EDF, mas não me oponho à nacionalização. A criação de um sector energético europeu, o desenvolvimento das energias renováveis e o futuro da energia nuclear são aspectos vitais para o Estado e para o controlo que pretende exercer sobre o sector energético.
#É extremamente crítica em relação a Nicolas Sarkozy e mais moderada relativamente a François Bayrou.
Isso não é verdade. O que me assusta é a sua máxima: “não há gastos”. Acho-a muito perigosa. Se uma nação não investir nos pilares – universidades, pesquisa, inovação -, nunca conseguirá preparar-se para o futuro nem fazer face à globalização.
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